fim da escravatura
Desde que fui mãe sou escrava, escrava de um aparelho branquinho, fofinho que capta som e imagem no quarto do meu gordo e tem o nome de INTERCOMUNICADOR. "Será que já dorme?", não sei deixa-me espreitar o intercomunicador; "oh meu deus está-se a mexer", "oh meu deus, está a sonhar", "oh meu deus, caiu a chupeta, será que é preciso ir lá?", "ai que perdeu o boneco debaixo do edredon", "ai que está destapado", "oh meu deus, está a dormir a fazer o pino". Todas as noites é isto, desde que o deito até que a criatura acorda. O problema é que cada vez que ele se mexe acende a luz, e eu se tiver a dormir, acordo, cada vez que emite um ai ou um ui, acende-se a luz e a câmara apita, e eu acordo. E estou nestes despertares idiotas e só porque sim há 19 meses! É um vício, como o tabaco, quero estar sempre em cima do acontecimento, quero controlá-lo a 100%, sim ok, mas ele não vai trepar as grades, sair da cama, e fugir de casa com o seu boneco Júlio numa mão, a Júlia na outra e chupeta na boca.
E portanto hoje vou emancipar-me e dizer BASTA! A partir de hoje começa uma nova era, intercomunicador desligado na hora do soninho.