Cicatrizes Eternas
Muito tenho lido sobre as cesarianas e sobre os artigos que dizem que em Portugal se fazem em demasia, que as mulheres optam por este método por comodidade, os chamados "bebés com hora marcada". Muito se fala sem saber.
Acredito que muitas mulheres querem de facto uma cesariana, e terão os motivos dela, nisto do corpo todos os motivos são válidos a meu ver. Desde que não se esteja a pôr em risco a saúde de uma vida que não é nossa, venham todas as cesarianas do mundo ou todos os partos com dilatação de 10 dedos.
Também quando chegou a minha vez ouvi de diversas bocas que se tivesse sido num hospital público a coisa tinha-se dado para o parto vaginal, que se tivesse sido num hospital público o médico tinha esperado e mi mi mi. As pessoas falam sem saber e generalizam na maioria das vezes. Eu queria um parto normal, tenho pavor de cirurgias (já fiz 3) e imaginar uma em que estaria acordada arrepiava-me. Eu andei kms e kms, fiz agachamentos, deitei-me com almofadas debaixo do rabo, fiz sexo, tomei banhos de imersão, subi e desci escadas durante duas semanas seguidas. Posso dizer que nunca tive as pernas tão tonificadas como naquelas duas semanas que antecederam o nascimento do meu filho. Eu cheguei às 41 semanas sem sinais de parto algum. O meu útero continuava verde que nem uma alface. Eu fiz toques maldosos, eu tomei chá de framboesa, eu pesquisei "exercícios para acelerar o parto". Eu marquei uma indução, pus comprimidos no pipi, pus medicação na veia e o meu útero continuou verde que nem uma alface, apesar das contracções. Eu fiz tudo o que podia e mesmo assim acabei numa sala de partos mais equipada, em posição de Cristo com os pulsos amarrados. Não vou esquecer nunca o barulho que se houve vindo das nossas entranhas, o pânico que senti ao ponto de ter de levar um pouco de adrenalina porque a tensão começou a cair. Odiei a experiência, senti muito frio e medo. Quando o bebé saiu estava mais focada em tudo o que se estava a passar do que nele próprio, lembro-me de pensar que era enorme e só queria que ele chorasse. Lembro-me de pensar "tirem-no deste ambiente de operação por favor" e disse a meu marido, "vai com ele, nunca o deixes, eu fico bem". Se estava bem? Não, estava aterrorizada, tinha acabado de ser aberta e remexida e agora estavam a montar tudo lá dentro, só sentia uma pressão, a empurrarem e a empilharem. Este foi o meu momento mágico, não chorei, não ri, não nada.
Não escolhi, teve de ser. Mas aprendi, que planos, mais vale fazer apenas para aquilo que controlamos.